Muitos dias se passaram
Muitos dias passarão
À noite segue-se o dia
E assim os dias se vão
(Vinícius de Moraes)
(Vinícius de Moraes)
A jovem caminha pela praia sentindo nos pés a
lambida fria da onda. Olhar perdido no horizonte, ela procura em vão pelo amor de
outrora. Afasta-se um pouco da orla e, espraiando a canga colorida na areia
clara, senta-se numa posição de yoga a contemplar o nada.
Ela se equilibra na linha do tempo como o
surfista sobre a prancha.
O dia amanhecera lindo. Os primeiros raios de
sol cingiam a praia deserta àquela hora da manhã. Tratava-se daquele preciso momento em que uns
ainda não tinham levantado para iniciar o dia, e outros recém chegavam às casas
para encerrar a noite. Eles deveriam fazer parte do segundo grupo, porém,
decidiram emendar a noite no dia. Bêbados de contentamento, correram de mãos
dadas pelas pequenas dunas de areia, fizeram juras de amor e trocaram beijos
apaixonados. Aquele dia marcara para sempre sua vida.
O
entardecer na praia também é lindo, ela pensa. Uma brisa suave
acaricia seu corpo seminu e, imediatamente, a jovem estremece. Avista ao longe
uma prancha erguer-se na ponta de uma onda. E, sobre a prancha, o rapaz moreno
de braços abertos, como se fosse um pássaro gigante alçando vôo. Os olhos dela
marejam e assumem um brilho diferente.
Conheceram-se na praia dois verões antes.
Desde então foram vistos sempre juntos. Ele nas ondas, ela na areia. O gosto
pela natureza, o prazer de curtir o mar e o sol foi o que mais os aproximou.
Não eram da noite, eram do dia. Mas, como todos os jovens, participavam de
festas com amigos. Não eram do álcool, eram do refrigerante, mas nas festas até
bebiam um pouco. Amavam-se e tinham sonhos.
Naquela madrugada fatal tinham bebido. Depois
das brincadeiras dos apaixonados, ela jogara seu corpo cansado e sonolento na
areia macia. Ao seu lado, ele tentava fazer com que se levantasse. Vamos curar esta ressaca no mar,
argumentava. Mas ela preferiu a areia. Ele, então, levantou-se e correu na
direção do seu destino.
Há longos anos ela arrasta sua canga na mesma
areia, esperando que o mar devolva o que lhe tirou. Afinal, sabe que a onda que
lambe seus pés hoje pode ser a mesma que, antes, engoliu seu amor.
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