Fui apresentada a ele quando comecei a trabalhar.
Era, de certa forma, uma situação inusitada, pois ninguém na minha família apreciava.
No escritório, parecia que todos gostavam e estavam habituados a ele, menos eu.
Tentando disfarçar, eu participava das rodinhas de bate-papo com os colegas.
Ele era presença constante em todos os acontecimentos. E sua negritude me
atraía e me causava repulsa ao mesmo tempo. Assim como o cheiro forte,
característico, diferente de tudo o que eu já sentira.
Ficamos, assim, nesta aproximação lenta durante
algum tempo. Mesmo sem ver, sabia quando ele adentrava pela sala. Sem tocá-lo,
podia sentir o calor de sua presença. Era forte e deixava marcas por onde
passava. Fui me deixando seduzir. Não de uma forma irresistível. Ao contrário,
eu me sentia bem segura. Ia me entregar àquele prazer por vontade, curiosidade
e também pela pressão velada dos colegas. Decidi me aventurar e não me
arrependi. Foi uma experiência encantadora. Repeti muitas outras vezes, mas
somente no horário do trabalho. Em casa nem pensava nele. Minha vida doméstica
seguiu inalterada.
Ele não saiu da minha vida com a mesma mansidão
com que entrou. Foi uma ruptura brusca. Fui demitida. Nunca mais ele aqueceu
minhas tardes frias. Não me lamentei, nem por ele, nem pelo emprego. Foi um affair de ocasião. Passou. Nunca senti
sua falta.
Só nos reencontramos anos depois. Primeiro vi no
shopping. Depois em outdoors e na televisão. Fazia sucesso - o negrão estava em
alta. Senti uma pontinha de saudade. Lembrei do nosso primeiro contato, do
calor dele nos meus lábios. Então, já madura, ciente dos meus desejos e
possibilidades, resolvi ir ao seu encontro. Mas fui levada inteiramente pela
emoção daqueles primeiros dias de estagiária, quando, muito jovem, me entregara
ao sabor da aventura. Desta vez, estava preparada para apreciá-lo com meus
cinco, ou seis, sentidos. E de tudo o que mais me seduzia ainda era o cheiro.
Hoje, nem preciso sorvê-lo por inteiro. Sentir o
seu aroma já me aguça todos os sentidos. Dobrei-me aos seus encantos. Não vivo
mais sem um bom cafezinho.
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