domingo, 11 de dezembro de 2016

CONFISSÃO

 

            Sei exatamente o momento em que decidi matá-la. Não foi quando ela me deixou. Foi quando estávamos no auge da paixão. No descanso dos múltiplos orgasmos. Aconteceu como num sonho. Uma visão. Percebi  que ela não poderia viver para dar a outro homem o mesmo prazer que me levava à loucura. Embora, naquela época, nem passasse pela cabeça dela ser de outro. Mas eu sabia. Conhecia a vida. Ela estava recém debutando e eu tinha quinze anos a mais. Com o tempo, ela ficaria experiente e cada vez melhor. Insaciável, talvez. E eu ficaria velho, sem graça. Ela ia querer novos parceiros, com certeza. Então, chegaria a hora de matá-la. E por saber que a vida dela seria curta e que caberia a mim a execução, é que fui me tornando o melhor homem do mundo. O melhor amante, o melhor amigo, o mais romântico. Eu a enchi de mimos, carinhos, flores, para que ela demorasse mais a se enjoar de mim e sair em busca do futuro predestinado. Assim me amaria e me desejaria por mais tempo. Na verdade, tantos mimos e afagos me aliviavam a consciência. Faziam-me sentir menos culpado por ter que matá-la um dia.
A vida dela seria curta, mas eu a faria muito feliz.
            Ela me levava ao êxtase, como se fosse a mais potente das drogas, e sem aquilo eu não viveria mais. Quando me deparei com esse pensamento, fui obrigado a rever minha decisão. Será mesmo que eu deveria matá-la?  Afinal, de que adiantaria, se o que me motivava era não poder viver sem ela? Melhor o suicídio, e pronto! Mas ela não teria inteligência, nem maturidade, para entender a grandeza do meu gesto. Não, eu seria apenas mais um fraco a morrer de amor. Não. O certo era matá-la, para que, além de mim, ninguém mais experimentasse da sua droga. E eu? Viveria com a lembrança dela e a certeza de que fora somente minha.
            Algumas mulheres são assim mesmo, grudam na mente do cara de tal forma, que só matando. De que outro jeito apagaria o sorriso dela me convidando para a cama? Como eu ia me livrar do seu cheiro de sexo molhado? Como resfriar meu corpo do corpo dela? Não. Não tinha outro jeito. Só matando. A morte resolve tudo. Acaba com o sofrimento. Encerra a questão.
Além disso, ela não saberia contar esta história como de fato aconteceu. Somente eu sei por que um de nós teve que morrer. Vamos virar personagens de um romance. Eu mesmo vou escrever esta história. Meu livro vai povoar a imaginação das pessoas e preencher o vazio da vida delas. Minha história vai servir também para alertar menininhas recém chegadas ao mundo adulto, do quanto elas são cruéis com pobres homens enfeitiçados pelos seus olhinhos de promessas. A vida adulta é de muita responsabilidade. Quando era guri minha mãe me obrigou a ler O Pequeno Príncipe. Achei meio bobo, mas anotei algumas coisas interessantes. Outro dia vi no meu caderno: você é eternamente responsável por aquilo que cativa. Então, eu entendi uma porção de coisas – realinhei meus pensamentos com os desse cara.
            Sei que fiz a coisa certa. Ela não só me cativou, ela me viciou. Não tinha outro jeito.

            Agora, sim. Eternamente responsável.

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